sexta-feira, outubro 10, 2014

NOVELA DA DOENÇA, Capítulo 4 - A mãe taralhoca

Pelo sim, pelo não, penso que para descartar a hipótese das pintas serem uma qualquer reação da Joana ao antibiótico, o médico da urgência afirmou a pretensão de o alterar. Perguntou à mãe taralhoca qual tinha sido aquele que ela havia começado.
«Clavamox», disse a mãe taralhoca, completamente certa do que afirmava.
«Trouxe-o? Ou a embalagem?». Obviamente que não, então não estava ela mesmo a ver o frasco e a embalagem à sua frente, para alguma coisa lhe servia afinal ser mãe de três, acumular em nove anos de maternidade já algumas enfermidades e ainda por cima ter uma irmã enfermeira, ela era e demonstrava ser uma mulher atenta a estar coisas.
 «E qual deles, sabe? Se é 125...250...?». Mãe taralhoca de três, com experiência de enfermidades e irmã enfermeira completamente muda, a sentir-se muito palerminha, pois claro que os xaropes têm dosagens diferentes de medicamento... E a tentar ajudar, com voz baixinha a soar lá de dentro do buraco para onde tinha acabado de cair: «Ela tem 7 kg e toma 5ml de 8 em 8 horas, não sei se ajuda...»
E lá saiu a mãe taralhoca do hospital, em tempo recorde (de, penso, menos de uma hora), com nova prescrição (com inclusão de medicamento para atenuar as comichões) para, antes da farmácia, passar no trabalho, onde explicou o que se andava a passar... De onde saiu, dali a pouco tempo, para a farmácia. E na farmácia: «Quer o genérico ou o de nome...?» Ao que a mãe taralhoca tomou a sua decisão: «É melhor o de nome, como é uma questão de reação ao primeiro antibiótico...». E a farmacêutica, a falar baixinho, mais para si, enquanto olhava para a receita: «Então é o Clamoxil... vou já preparar».
Foi nesse momento que a mãe taralhoca estacou. Clamoxil. «Desculpe, não se importa de me mostrar a embalagem antes de o ir preparar...?».
Escusado seria dizer, se não houvesse uma necessidade de auto-flagelação, que a mãe verdadeiramente taralhoca teve que voltar novamente à Estefânia, filha slingada há não sei quanto tempo a fazer doer as costas (toma lá práprenderes a não ser taralhoca de todo!), onde os senhores do balcão administrativo lá autorizaram a sua reentrada para que fosse ter com o médico que lhe tinha observado a filha para que alterasse a prescrição. E lá esperou a mãe taralhoca, filha slingada há não sei quanto tempo, à porta de uma sala vazia onde, quarenta minutos depois, uma outra mãe lhe explicou que o médico em questão tinha sido chamado para uma reunião e todos os seus pacientes haviam sido transferidos para uma colega... mas é óbvio que ninguém sabia da sua existência, uma vez que não tinha dado verdadeiramente entrada na urgência... e lá foi imiscuir-se numa outra sala, falar baixinho a uma médica do facto de ter dado ao médico anterior o nome de um antibiótico e se ter enganado, possibilitando que ele passasse uma prescrição exatamente desse mesmo antibiótico quando o objectivo era mudá-lo. 
Honra feita à nova médica, fosse por enfrentar só mais uma mãe taralhoca como muitas ou por ter mais com que se entreter nas urgências, limitou-se a mudar a receita e... pronto. Depois claro que deve ter pensado: «caramba, onde é que estes miúdos vão desencantar estas taralhocas...?»
Rita

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